Carla Reita Faria Leal e Ana Paula Marques Andrade
Recentemente, o Supremo Tribunal Federal julgou inconstitucional norma estadual que limitava o direito à licença-adoção a apenas um dos adotantes quando se tratar de casal formado por servidores, civis ou militares.
O caso levado a julgamento envolve duas leis editadas no estado do Espírito Santo que tratam sobre licença para servidores(as) públicos(as) que adotarem crianças. De acordo com as leis impugnadas, se o pai e a mãe que estiveram adotando forem ambos servidores públicos, neste caso, somente um deles terá direito à licença.
A Procuradoria-Geral da República ajuizou Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) contra essa previsão, afirmando que as normas questionadas criaram um tratamento desigual entre servidores civis e militares que são pais biológicos e aqueles que são pais adotivos, já que, se um casal de servidores tiver um filho biológico, ambos terão direito à licença. Por outro lado, se um casal de servidores adotar uma criança, pela redação da lei, apenas um deles teria direito à licença.
Ao julgar a demanda, o STF relembrou que é incompatível com o texto constitucional qualquer norma ou interpretação que implique diferenciação entre o vínculo biológico e o adotivo. Segundo a jurisprudência da Corte, os prazos da licença-adotante e da licença-gestante devem ser equiparados, já que se impõe a igualdade entre os filhos e os direitos da mulher, afastando-se qualquer vinculação à condição biológica de gestante.
Assim, para a Corte Suprema, nesse contexto, caso haja adoção por casal formado por servidores, civis ou militares, ambos poderão usufruir de licença remunerada, ainda que por prazos diversos, isto é, um gozará da licença-adotante, ao passo que o outro desfrutará da licença-paternidade, nos exatos moldes do Regime Jurídico Único dos servidores públicos civis do estado.
Recordou o STF que a inexistência de norma expressa autorizativa do usufruto de licença ao servidor público monoparental por prazo compatível com o da licença à gestante não pode ser utilizada como motivo para negar a sua fruição, diante do atual cenário constitucional normativo e da jurisprudência firmada pela Corte, a qual estabeleceu, inclusive, o conceito único e abrangente de licença-parental, em superação à inadequada distinção entre licença-maternidade e licença-paternidade.
Vale lembrar que o STF nos últimos anos vem se deparando e se manifestando em várias ações relacionadas com a licença-parental, como a decisão que estabeleceu que o termo inicial da licença-maternidade e do respectivo salário-maternidade começa a partir da alta hospitalar do recém-nascido ou de sua mãe (ADI 6327); a que decidiu que os prazos da licença-adotante não podem ser inferiores ao prazo da licença-gestante, o mesmo valendo para as respectivas prorrogações (Tese fixada na Repercussão Geral Tema 782); definiu, ainda, que trabalhadora gestante tem direito ao gozo de licença-maternidade e à estabilidade provisória, independentemente do regime jurídico aplicável, se contratual ou administrativo, ainda que ocupe cargo em comissão ou seja contratada por tempo determinado (Tese fixada na Repercussão Geral – Tema 542); e, mais, fixou a tese que a mãe servidora ou trabalhadora não gestante em união homoafetiva tem direito ao gozo de licença-maternidade e, caso a companheira tenha utilizado o benefício, fará jus à licença pelo período equivalente ao da licença-paternidade (Tese fixada na Repercussão Geral Tema 1072).
Não se pode esquecer ainda que há aproximadamente um ano a Suprema Corte reconheceu a omissão inconstitucional relativamente à edição da lei regulamentadora da licença-paternidade, prevista no art. 7º, XIX, da Constituição, estabelecendo o prazo de 18 meses para o Congresso Nacional sanar a omissão apontada e, caso não sobrevenha a lei regulamentadora no prazo estabelecido, competirá a esse Tribunal fixar o período da licença paternidade.
Percebe-se que diante de tais decisões e teses fixadas o STF busca proteger a família (arts. 226 e 227, CF/88), a infância (arts. 6º e 203, CF/88), além de concretizar a necessária divisão de responsabilidades entre homens e mulheres (art. 5º, I, CF/88), contribuindo para o alcance de uma sociedade mais igualitária.
*Carla Reita Faria Leal e Ana Paula Marques Andrade são membros do Grupo de Pesquisa sobre o meio ambiente de trabalho da UFMT, o GPMAT.