Carla Reita Faria Leal e Akili Lobo

As mudanças climáticas são causadas por ações humanas e suas consequências são percebidas na perda de qualidade de vida no planeta, uma vez que estao associadas a eventos climáticos extremos, como ondas de calor excessivo, inundações, secas, incêndios florestais, tempestades tropicais, nevascas, furações, tornados e tsunamis, dentre outros. Eventos decorrentes do aquecimento global ou do aumento da temperatura media do planeta.
Além dos graves impactos na sociedade, na flora e fauna ou ecossistemas naturais, o crescimento da frequência desses eventos extremos climáticos vem provocando a exposição dos trabalhadores a condiçoes de trabalho muito mais adversas.
Pesquisas apontam para um acréscimo de 1,5° C acima dos níveis pré -industriais globalmente, sendo que o aquecimento em questão seria resultado de “atividades industriais e transportes, e queima de combustíveis fosseis (derivados do petróleo, carvão mineral e gás natural) para geração de energia, a conversão do uso do solo, agropecuária, o descarte de residuos sólidos (lixo) e o desmatamento.”
Ainda na década de 80, o Secretário-Geral da ONU convidou a ex-Primeira-Ministra da Noruega, médica e mestre em saúde pública, Gro Harlem Brundtland, para instituir e presidir a Comissão Mundial sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento. Comissão que essa elaborou o relatório “Nosso Futuro Comum”, o qual não só trouxe o conceito de “desenvolvimento sustentável”, mas também demonstrou a relação da pobreza nos países ditos de terceiro mundo e o consumismo excessivo nos países desenvolvidos como fatores fundamentais para crises ambientais globais.
O relatório “Nosso Futuro Comum” deixou claro que a desigualdade é uma premissa para compreensão de quais são as pessoas mais afetadas pelas mudanças no clima. Em aprofundamento, existe um marcador de classe e raça que determina aqueles que serão mais afetados: as pessoas periféricas, racializadas e pobres.
A descrição acima coincide com o perfil da maioria dos trabalhadores no Brasil, o que faz com que o nosso olhar se volte para o modo de exploração do trabalho e as perspectivas de enfrentamento das desigualdades e, consequentemente, das mudanças climáticas, isso visando a garantia de direitos aos trabalhadores
Neste contexto, a Organização Internacional do Trabalho (OIT) publicou em abril de 2023 o relatório Ensuring safety and health at work in a changing climate, algo como “Garantir a segurança e a saúde no trabalho num clima em mudança”, o qual aponta que mais de 70% dos trabalhadores no mundo podem estar expostos a graves riscos para a saúde relacionados às mudanças climáticas, no qual diversas condições de saúde dos trabalhadores são associadas a estas, como cânceres, doenças cardiovasculares, doenças respiratórias, disfunções renais e problemas de saúde mental, entre outras tantas.
Este cenário implica em mais um desafio a ser enfrentado para a garantia dos direitos dos trabalhadores, sobretudo ao direito ao meio ambiente do trabalho ecologicamente equilibrado, uma vez que exige a avaliação dos riscos emergentes e a adaptação das práticas de trabalho para garantir a saúde e segurança do trabalho e evitar, a exemplo, a exaustão devido ao calor e à exposição a poeiras e doenças.
As medidas de adaptação são o foco das discussões na atualidade. O governo brasileiro, embora tenha reestabelecido o Ministério do Trabalho e Emprego, trata a mitigação do problema mais pela via da indenização e do que da prevenção, o que se revela insuficiente e traz a necessidade do desenvolvimento de estratégias eficazes para mitigar os efeitos da mudança do clima no ambiente de trabalho.
Ainda que não haja menção específica à mudança do clima nas normas de direito do trabalho, há previsão sobre a identificação de perigos externos previsíveis na Norma Regulamentadora n.º 01, o que impõe a avaliação de riscos ocupacionais, a fim de que sejam implementadas medidas para salvaguardar a saúde e segurança dos trabalhadores.
O mencionado relatório da OIT conclui que é imprescindível a reavaliação da legislação existente e, se necessária, a criação de novas normas para assegurar a efetividade das medidas preventivas de segurança e saúde no trabalho.
No entanto, a efetividade das leis e políticas de saúde e segurança no trabalho para a mitigação dos danos climáticos, a que milhares de trabalhadores estão submetidos no Brasil, depende de atuação conjunta entre o Poder Público, empresas, trabalhadores e a sociedade civil. Nesse aspecto, os empregadores podem e devem desenvolver um papel essencial reduzindo as emissões de carbono e adaptando as práticas de trabalho ao novo cenário de risco, tornando-as mais sustentáveis. É o que esperamos!
Carla Reita Faria Leal e Akili Lobo são integrantes do Grupo de Pesquisa sobre o meio ambiente do trabalho da UFMT, o GPMAT.