Carla Reita Faria Leal e Francielly Rodrigues Costa
A jornada 6×1, tema intensamente abordado na mídia durante a última semana, é a modalidade de jornada na qual o trabalhador se ativa por 6 dias consecutivos durante a semana e descansa em apenas um, ou seja, somente no sétimo dia.
A jornada ordinária, aquela que abrange a maior parte dos trabalhadores no Brasil, prevista na Constituição e na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) é de 8 horas diárias e 44 horas semanais, ou seja, o regime 6×1 que há mais de 35 anos é adotado no Brasil. Entretanto, há outras possibilidades de arranjos, por meio de compensação de jornada prevista em acordo individual ou acordo e convenção coletiva, ou ainda jornadas diferenciadas previstas em lei, como, por exemplo, a jornada de 12 horas de trabalho por 36 horas de descanso.
A discussão sobre o fim do regime de jornada 6×1 voltou à mídia, às redes sociais e às rodas de conversas, sobretudo por conta da proposta de Emenda à Constituição (PEC) apresentada ao Congresso Nacional pela Deputada Federal Erika Hilton, por meio da qual pretende não só acabar com a jornada no sistema 6×1 prevista legal e constitucionalmente, mas também implementar a jornada na escala 4×3, no qual o trabalhador exerce suas atividades em quatro dias da semana e folga em três dias.
A deputada aderiu à bandeira do Movimento Vida Além do Trabalho (VAT), que desde o ano passado defende o fim da escala 6×1, encabeçando, inclusive, um abaixo-assinado virtual intitulado ‘Por um Brasil que Vai Além do Trabalho,’ que conta atualmente com mais de 1,3 milhão de assinaturas, pleiteando que os trabalhadores tenham direito ao tempo pessoal e familiar.
Paralelamente a esse movimento, já há um projeto no Brasil testando o modelo 4×3 em várias empresas, o qual se chama “4 day week Brazil”. A Fundação Getúlio Vargas e a Boston College são responsáveis pelo monitoramento de suas atividades e de seus resultados. Segundo informações da revista Exame sobre o projeto, com a redução dos dias trabalhados houve uma redução de estresse em 62,7% dos indivíduos; a maioria (64,9%) deles não se sentem desgastados no final do dia; mais da metade (56,5%) não estão frustrados como antigamente e quase 30% dos participantes (28,6%) não mudariam de emprego para trabalhar cinco dias por semana por salário nenhum.
A revista aponta também que houve a redução de desgaste emocional em 49,3% e de exaustão em 64,5% dos trabalhadores beneficiados com a redução dos dias de trabalho. Já 44,4% dos trabalhadores consideram que a semana de 4 dias tem melhorado sua capacidade de cumprir prazos; 67% dizem que trabalhar um dia a menos reduziu ansiedade semanal; 50% dizem que reduziu sua insônia e 57,9% sentem que conseguem conciliar melhor vida pessoal e profissional. Ficam evidentes, assim, os benefícios da redução da jornada.
A proposta da PEC, embora pareça ser ambiciosa, não é uma novidade. Ela segue uma tendência mundial, resultado da percepção de que a produtividade não está ao número de horas trabalhadas, muito pelo contrário. Por outro lado, reconhece que há uma necessidade de adaptações às novas realidade do mercado de trabalho e de atender os reclames dos trabalhadores por mais qualidade de vida e mais tempo para atividades com a família.
Importante lembrar que pesquisa do Instituto Gallup, realizada em setembro deste ano, revelou que o Brasil está em quarto lugar no ranking de trabalhadores com mais tristeza e raiva na América Latina, bem como o sétimo entre os mais estressados. Por outro lado, relevante levar em consideração que a falta de flexibilidade nas horas trabalhadas, as extensas jornadas e a pressão para atingir metas de produção podem impedir que os trabalhadores desenvolvam estratégias de autoproteção eficazes, ficando expostos a acidentes e adoecimentos, além de sentimentos de frustação por não conseguirem usufruir a vida privada e familiar.
Para ser discutido na Câmara e no Senado, o texto da PEC precisa do apoio de ao menos 171 assinaturas de parlamentares. Segundo informações da assessoria da deputada, a proposta já consta com cerca de 100 assinaturas.
Entendemos que é imprescindível que a legislação atual seja revisada para incorporar práticas que considerem o bem-estar dos trabalhadores e a prevenção de acidentes. É nesse contexto que a PEC proposta pela Deputada Federal Erika Hilton, ganha relevância, pois visa justamente abolir a escala 6×1 e promover um modelo de trabalho mais saudável e sustentável. Trata-se, basicamente, de reafirmar a dignidade promovida pelo trabalho exercido, alinhando-o com os direitos fundamentais previstos na Constituição Federal.
*Carla Reita Faria Leal e Francielly Rodrigues Costa são membros do Grupo de Pesquisa sobre o Meio Ambiente do Trabalho da UFMT, o GPMAT.